Não, a minha viagem ao Brasil ainda não acabou. Mas preciso de pensar na minha vida e na vida que quero para mim. Eu sou do Porto! Entretanto, vou me encontrando por outras paragens que, na verdade, também são as minhas! Mas quero que saibam que eu, eu sou do Porto, carago! Sou tripeira da gema!
Cresci na Baixa. Por isso sou tripeira da gema. Os meus pais e eram criados no Porto.
Comprava pão na Padouro, ao lado do Bolhão.
No Bolhão, onde a minha mãe encomendava as frutas e hortaliças. Mais acima, vestia-me na Nelma, da Rua Formosa.
E, ali, mesmo ao lado ficava a mercearia do Sr. Fernando. Ainda hoje está lá. Chama-se Comer e chorar por mais.
O Sr. Fernando era vizinho da minha avó Micas que vivia por cima, no 3ºandar, gaveto com Santa Catarina.
Na Rua de Santa Catarina, onde eu ia comer rissois à Império, ainda quentinhos!
Perdia-me com as novidades na Palladium e, de mão dada, com o meu pai admirava os mercedes em exposição naquela que é a Zara de hoje. Quando estava doente, ia ao pediatra Bianchi de Aguiar em Sá da Bandeira.
E lanchava, depois, mais abaixo, torradas de pão de forma, aparadas, com leite Ucal, no café Turista,.
Na Rua de Santo António, actual 31 de Janeiro, visitava a minha tia-madrinha Lena na loja Chic Parisiense.
Via filmes no Passos Manuel e, ao lado, comia pasteis de carne e bebia sumol de ananás, almoçava ao domingo na Mamuda, nos Poveiros, e na Cunha, à terça, na mesa redonda.
Mais tarde, na adolescência, refugiava-me na Torre dos Clérigos, depois de rarear o oxigénio na esforçada subida. Deixava-me estar a comer croissants de chocolate e a sonhar com o rapaz giro do liceu, que passava perto do meu colégio de freiras e só de meninas de bata branca, ou então com o meu Brasil, chorando a cantar a Bethânia que, de cor e salteado, me enchia o coração com versos melosos e tristes. Às vezes, ainda é assim hoje!
Mais havia a dizer, ah se havia, mas o essencial é eu sou do Porto, carago!
mh