Respiro fundo! Olho ao espelho. Inspiro. Tenho medo. Por vezes, tenho medo. Expiro. Nem sempre.
Certamente, quando me propus fazer o blog devo ter pensado que me estaria a expor. Não me lembro. Mas, sim, devo ter pensado nisso. Sem dúvida, pensei-o. Não que importe. Eu sou assim. Nua perante os outros. Não sei disfarçar. No entanto, não pensei a sério sobre que raio de montra seria esta onde me queria mostrar, porque o queria fazer, como queria dizer o que faço, como ia ficar assim como estou.
Exposta. Com medo. Respiro fundo. Como sempre impulsiva, comecei a fazê-lo. Expiro.
Então parei. Por certo, respirei bem fundo, até ficar cheia de ar. E, com certeza, expirei até ficar sem ar. Talvez provavelmente, até ficar sem chão. Tão cheia de medo, olhei para mim, tal qual sou, assim como eu me vejo. Sem imaginar como me veem os outros. Eventualmente, diria, não me interessam os outros. Mentiria, claro está!
Não apenas me interesso, como penso como me veem os outros. Imagino o meu pior. Os meus defeitos. Os meus erros. Como será que me imagina quem tem imaginação? Como será que pensam que é o meu dia? As minhas noites? Como me inveja o carro, a casa, o escritório, quem me tem inveja? Como me despreza a alegria, os sonhos, a felicidade, quem me tem desprezo?
Ou, também, por outro lado, o melhor. As minhas qualidades. Os meus afectos. As minhas alegrias. Nesse sentido, como me gosta quem gosta de mim? Como me ama quem me ama? Como me admira quem me elogia?
Os outros não me dão medo. Eu tenho mais medo de mim. Os outros quase sempre eu os gosto. É que eu não tenho ódios, não consigo, relevo, desculpo, prefiro esquecer, perdoar até. O que me dá medo sou eu. Não tolero as minhas falhas, cobro-me os erros, julgo as minhas atitudes. Sou tantas vezes carrasco de mim mesma. Mas, tanto quanto sei, também tenho muitas imagens feitas sobre os outros. Normalmente, dizem, vejo-os no meu reflexo. Penso que serão assim sobre mim, também.
Respiro fundo. Às vezes não tenho medo. Expiro. Nem sempre.
Quando estou apaixonada, nunca tenho medo. Eu sou de paixões! Muitas paixões. Apaixono-me por homens e mulheres, por animais, flores e objectos e dedico-me. Apaixonadamente. Sou de todos um pouco e, por vezes, não sou de ninguém. E amo, claro, mas amo a poucos e a esses, a quem amo, não troco por nada deste mundo. Quando amo tenho medo. Tenho medo de amar demais. Amo incondicionalmente os meus filhos. Depois há o Amor. O outro. É desse que tenho medo. Mas acredito nele. Pois sem Amor não sou eu.
Quanto a mim, tenho uma boa dose de amor próprio. Descobri recentemente que não tanto quanto eu julgava. Adiante. Ao que tenho, não só o cultivo e nutro com dedicação, como o espalho num encanto, que me dá frutos doces e maduros. Depois, pelo contrário, por vezes, também me falha. O amor-próprio. E sofro, sofro quer de narcisismo que me escapa ao controle, egocentrismo à qual não resisto, como ainda sofro de apego por tudo aquilo que acho que deveria ser permanentemente, para sempre, como eu quero.
Respiro fundo. Sufoco. Eu sei, sou impossível!
E lembro-me de Caetano, uma das minhas paixões! E lembro-me também quando o ouvi pela primeira vez, que como ele, eu não entendia nada do que havia à minha volta. E aí nunca tive medo. Curioso. Nos braços seguros da beleza da arte nunca tenho medo.
A ti, que seguraste tantas vezes enquanto chorava,
Caetano, eu era menina, tu eras homem (tão menino como eu!). Fazias-me sonhar e eras tão belo, tão preto, cheio daquele sol imenso, que é o sol da terra da felicidade. E os teus cabelos eram o meu mar.
Dizem que cresci. Mentira. Não sei sequer quem bem sou. Mas esforço-me para que acreditem, às vezes. Como tu, sou o oposto da certeza e caminho na fé dos homens, que no momento que se julgam deuses, nada são. Também eu me julgo. Bela. Eterna. Espelho de uma força que me leva quando tudo o que quero é estar quieta. Mas eu … eu sei lá o que quero. Mentira. Eu sei sim. Sabes, é que tenho medo. Por enquanto, estou segura, aqui, contigo.
A verdade é a ilusão da tua voz ao meu ouvido que diz “ Você é linda, mais que demais!” e eu acredito. E não piro. Respiro.
Respiro fundo.
Eu tenho mil e um planos. Como se fosse uma aventureira. Não só tenho capas de lombada larga cheias de passado, como pastas transparentes etiquetadas de futuro. Quer pequenos cadernos vermelhos, pretos, lisos, escritos, com linhas, em branco. Quer lápis de carvão de bico fino e grosso, borrachas que não deixam marcas e canetas de tinta de todas as cores. Sem dúvida, eu necessito planear. Para que ache que controlo tudo. Assim como quem tem horas marcadas, dias previstos. Antes de tudo. Depois de nada. Porque não é nunca assim.
Eu sei, depois, que não uso relógio, sequer olho o calendário. Que não me controlo nem a mim. E que, no meio de tantos planos, nada farei senão o que me der vontade. Agora. Respiro fundo. Sem medo.
Principalmente, quando se decide algo que sai fora do expectável, do redondo, do certo, do igual, do mesmo, a tendência dos outros, próximos ou distantes, íntimos ou circunstanciais, é de questionar colocando obstáculos, quimeras, juízos. Porventura, cheios de medo. Porventura, querendo estar no lugar do outro.
No dia que decidi transformar o meu sonho numa aventura, perguntas surgiram seguidas umas das outras.
Como é que vais? És louca e se te afogas? E se enjoares? E se te sentires só? E se tiveres medo? Com que dinheiro? E os teus filhos? Vais deixa-los? E o trabalho? Vais deitar tudo a perder? E se te matam? E se te roubam? E se te perdes? E se te desiludes? E se te arrependes? E se te engasgas? E se adoeces? E se tiveres saudade? E se não gostares da comida? E se chover? E se fizer muito calor? E se a Dilma voltar? Ou pior, o Temer ficar? E se o Jô emagrecer? E se … E se … E se …
E por ai vai … os Se’s são senhores absolutos de certezas inabaláveis precedidas de um fatalismo ignorante e medroso que se encerra na rua de cada um, dentro de portas, seguros, com as suas verdades e as suas (sobre)vivências.
E eu respiro fundo. Assim, muito fundo. Ah, que se dane!
Certamente, eu tenho medo. Claro. Por acaso o medo que eu tenho é de gostar. Tenho tanto medo de gostar, de gostar muito, de me seduzir, de me viciar, de morrer de amor por esta partida que não tem volta marcada. Porque, depois, mesmo quando chegar, tenho de chegar, outra vez, tudo o que conseguirei pensar será em partir, tenho de partir, de novo. E, entretanto, respiro fundo.
O Gabriel Pensador, poeta moderno, filosofo de canções, escreveu estes versos. Estes são uma pequena parte de um todo, que representa uma nação de homens, que nos representa.
Assim que os ouvi pela primeira vez fiquei sem chão, de tanto incomodo que me causaram, incomodo bom, incomodo de mudança. Foi sobretudo medo.
“Até quando?”
Muda, que quando a gente muda o mundo muda com a gente
A gente muda o mundo na mudança da mente
E quando a mente muda a gente anda pra frente
E quando a gente manda ninguém manda na gente!
Na mudança de atitude não há mal que não se mude nem doença sem cura
Na mudança de postura a gente fica mais seguro
Na mudança do presente a gente molda o futuro!
Sem medo. Adiante. Para a frente. E respiro fundo.
Helena