Pousada Colonial em Salvador

A minha casa aguardava-me. Eu iria ficar na Pousada Colonial em Salvador! Uma beleza!

POUSADA COLONIAL EM SALVADOR

Assim que entrei na Rua Direita de Santo António percebi, mais uma vez, que Salvador era familiar. A idade das pedras da rua transportavam-me para o lugar que eu tinha deixado.

Portugal estava em cada pedra. Só o calor logo me trouxe de volta!

Aquela humidade quente, colada na minha pele, que me reconfortava, que me abraçava, dizia-me que eu estava lá. Que eu estava no Brasil.

POUSADA COLONIAL EM SALVADOR

O taxi parou, a meio da rua, e, finalmente, eu chegava ao meu lar pelos próximos três dias, a Pousada Colonial.

Todos os sítios que eu viria a ficar, durante a estadia no Brasil, mais sofisticados, mais luxuosos, não me voltariam a dar aquele conforto.

Aquele encontro senti ser um encontro de almas.

Os meus poucos dias em Salvador foram tão intensos que se tornaram irrepetíveis: simples e genuínos!

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O Seu Chico, o taxista, bateu as palmas a anunciar-me e veio um rapaz, com um largo sorriso, que recolheu a mala. A tal pesada mala que trazia tudo o que tinha para as próximas semanas.

Entrei, estava fresco, e isso contrastava com o exterior, e logo encontrei três passageiros do navio, um casal, a Rosa, filipina, e o Friedrich, alemão, e um senhor, o Helmut, também alemão, que estavam lá hospedados. Viria a encontrar mais dois casais ingleses, que não me lembro o nome, mas que eram muito simpáticos e com quem tomaria pequeno almoço.

Fiquei surpresa, mas logo entendi.

Tendo em conta a oferta de hospedagem, que não é muita no Centro Histórico, o número de passageiros desembarcados e os seus interesses, como os meus, só nos poderíamos ter encontrado ali na Pousada Colonial como pelas ruas de Salvador.

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Dirigi-me à recepção da Pousada Colonial e fui recebida pela simpática Kelly que desde o inicio da minha marcação, muitos meses antes, se tinha disponibilizado para o transfer do aeroporto. Mas como cheguei pelo porto ela tinha dito que não era necessário e foi aí que percebi que sido enganada.

– O quê? Quarenta reais do porto aqui?! Jesus, isso é um roubo! Nunca ficaria mais de uns vinte, mas com o trânsito e a mala, aí uns quarenta seria até demais. Já sessenta, você foi roubada, minina! – dizia-me ela escandalizada.

Viria a ser assaltada mais tarde. Mas, mais uma vez, os danos foram poucos.

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Estava exausta.

Não dormia há muitas horas e, na verdade, não dormia bem há muitos dias. O calor da Bahia cuidou do resto.

Mas o quarto onde eu fiquei, no último andar, o nº13, devolveu-me todo o descanso necessário e serenidade conquistada para repor animo e forças.

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Era lindo!

Grande de tábuas corridas e tecto de madeira, em vão de sotão, arejado por duas grandes portadas, na sombra do calor, que davam acesso à varanda, onde vi o meu navio partir da Bahia de Todos os Santos para outro destino!

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A cama enorme e macia era o terminar de um cenário que era perfeito. Que bem me sentia, que bom que assim cheguei ao meu Brasil!

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Tomei um banho demorado e frio e descansei sobre os lençóis brancos, da cama imensa, sem horas, com o vento quente a fazer dançar as cortinas leves, pois outra história, nas muitas histórias da minha vida, estava prestes a começar!

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Acordei eram cinco da tarde e era noite … ou estava o sol a incendiar o céu numa luta incandescente até a luz se extinguir por completo.

E eu estava no Pousada Colonial em Salvador. Não era um sonho.

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A sesta prolongada foi um ganho evidente pois fiquei muito bem disposta, tão bem disposta que tomei o terceiro banho do dia, vesti-me e saí para a rua para ir jantar.

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Ainda antes de sair, a Kelly sugeriu-me jantar na Casa Amarelindo, em pleno Pelourinho. Aceitei a sugestão!

Estava tão animada que nem me dei conta que além de não conhecer nada da cidade, era de noite e estava sozinha.

Não me intimidei. E fui!

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Olhei o mapa, que guardei de imediato, e percorri a rua em direcção à Rua do Carmo, onde ficava a minha referência a Pousada do Covento do Carmo. Confesso que senti alguma desorientação. Olhando para quem estava na rua, na verdade quase ninguém, pousei os olhos numa rapariga. Negra, jovem, que vinha de baixo em minha direção e que me inspirou confiança, por certo vinha de trabalhar e vinha também carregada de sacos. Era a Leda.

– Oi! Tudo bem? Pode dar-me uma ajuda? O Pelourinho fica muito distante daqui? – disparei sem respirar.

– Oi, meu bem! Tudo bem! – respondeu pausadamente – O Pelourinho é aqui bem perto! Mas você está sozinha? – perguntou.

– É, eu estou! Mas é perigoso? – receei.

– Bem, você é turista e tem esse ar de gringa … aí, nunca se sabe, e é de noite … olha, eu sou a Leda e eu estou indo para a frente, aí eu vou em casa pousar meus sacos, dar um beijo nos meus pais e levo você lá! – ofereceu-se de sorriso e coração aberto.

E eu aceitei. Confiando.

Fomos todo o caminho a conversar. Era professora de danças latinas e tinha vivido quatro anos em Barcelona, com o irmão que era músico. Voltara por causa de crise na Europa.

– É a primeira coisa que os pais cortam … as actividades extras! – explicava-me.

E como eu sabia disso, sentira-o na pele três anos antes, e a realidade era difícil.

Agora, voltara a casa dos pais e estava a trabalhar. Mas gostava de voltar. Percebi que os brasileiros têm esse sonho com a Europa. E eu que vinha de lá sonhava com o Brasil.

Levamos a vida a tentar encontrar-nos.

Trocamos telefones e um abraço de agradecimento, a Leda tinha sido a minha companhia e eu tinha sido a aventura que ela haveria de contar como novidade: a gringa que chegou sozinha de navio, que coragem!

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Entrei pela pousada, um antigo casarão do século XIX, onde iria jantar no elegante Pelô Bistrô … no ar ouvia Ivete Sangalo e isso agradou-me, a Veveta representa a Bahia como poucos, e sentei-me a apreciar o espaço.

Fresco, acolhedor e muito agradável! Pedi uma caipirinha!

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Fiquei a desfrutar do momento! Só queria estar ali! Só queria aquele silêncio embalado de Axé.

Dei uma vista de olhos na ementa e decidi-me por comida típica baiana. Eu não sou de tirar fotografias a comida e as poucas que tiro acho sempre que não fazem jus ao que me servem … e, neste caso, nem tirei fotografias nem registei nomes de pratos … culpa da caipirinha deliciosa! Fiquei com a ideia de que queriam servir comida bahiana com um toque internacional … gostei!

Gostei mais ainda da simpatia e da disponibilidade.

Na volta à minha pousada não arrisquei e regressei de táxi. Paguei 15 reais e o taxista foi obrigado a dar a mesma volta que eu havia dado de manhã, agora sem trânsito, mas à noite, porque o trânsito estava cortado no centro. É não havia dúvida!

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Ao chegar, subi, sentei-me na varanda principal do casarão, virada à rua, e sentindo o calor que suavizava às dez da noite, deixei-me ficar tentando acreditar em tudo o que estava a viver.

E estava grata.

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Dormi a minha primeira noite em terra desde há uns dias e soube-me bem.

Estava exausta e não tinha noção disso, até acordar com o dia a clarear às cinco da manhã, na verdade começou a raiar pelas quatro e meia, tudo estava silencioso e, eu, deixar-me ficar de novo a dormir.

O dia seria longo!

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Quando me levantei, às oito, o dia já era quente, da rua ouvia pregões a vender fruta, carros e motas que seguiam o seu destino, portas a fecharem-se e vozes estrangeiras nos corredores.

Estava na hora e a minha curiosidade chamava-me.

Desci para o café da manhã. Ficava no pátio da casa e tinha seis mesas. Apenas duas estavam livres. Apreciei a disposição em cima dos aparadores: frutas frescas, bolos tradicionais, pão de queijo caseiro, queijo e fiambre (ou presunto, dizem!), manteiga e compotas, vários pães frescos e saborosos, cereais integrais, sumos feitos na hora, café, leite, chá. E tudo o que nos apetecesse de fogão desde a tapioca à banana frita, ovos mexidos ou o simples estrelado (aqui chamam-lhe ovo frito!).

Adorei! Encontrei-me com os passageiros alemães que, em conversa, perguntaram se eu ia à orla (beira mar, entenda-se!), ao que disse que sim, mas de tarde. Logo ali combinamos um passeio, que a Kelly tratou de arranjar motorista e ainda de marcar jantar.

Seria uma tarde perfeita terminada com chave de ouro!

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Antes eu queria ir visitar o Pelourinho, em particular a Casa de Jorge Amado, e ver o Centro de Salvador de dia. Estava um dia quente mas nublado, achei que roupa fresca e vaporosa seria o ideal, até porque permitia esconder a bolsa que levava. O dinheiro já o tinha guardado nas sapatilhas. Não que eu achasse que era perigoso, mas a verdade é que ainda no navio me haviam vaticinado

“Assim desse seu jeito, sozinha, vai ser assaltada em Salvador, quer apostar?” Um exagero, achei!

Deram-me as dicas necessárias para me sentir segura: não aceitar a pulseira colorida, sorrir, não mostrar telemóvel, nem trocar dinheiro em público, ir por esta rua, não por aquela, enfim cuidados é sempre bom tê-los!

Dir-me-iam, mais tarde, que “minha querida, todo Pelourinho fala da gringa branquela que anda sozinha!”

Concluí que seria obviamente mais um exagero, que era, mas que talvez fosse verdade.

Eu não sou de medos. Saí e segui tirando fotografias acreditando no que via …

 

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