Boipeba, um paraíso perdido no tempo

Ao aproximar-me das margens comecei a ver a singeleza das coisas que beiravam o Rio Inferno. E que nome tão antónimo de tudo o que ali estava! Boipeba, é um paraíso perdido no tempo!

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Os barcos de marinheiros, pescadores de uma vida inteira, de uma única vida, descansavam de um dia de faina e embelezavam o cenário encantado.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Ali anunciava-se que “Todas as pessoas que têm um lindo e bom comportamento são a reserva moral da sociedade”.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

As ruas calcetadas de paralelepípedos apenas se deixavam pisar por pés nus. E da evolução dos tempos, apenas chinelos de dedo ou rolar por rodas finas e leves de bicicletas ligeiras,. Por ventura, calcar por cascos de cavalos serenos e éguas mansas que fazem o favor de transportar os bens e as pessoas.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

As casas, despudoradas e coloridas como uma caixa de crayons, estavam dispostas umas a seguir às outras. Tão bonitas, tão simples!

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Na praça de terra batida, arresta-se um burro velho, colo de um menino cansado ou de uma garota estafada. Mas são raros. Às pernas dá-se uso e anda-se e corre-se de um lado para o outro, a pé, com a cabeça na lua.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Quando cheguei a Boipeba eram já cinco da tarde e a luz iniciava o lusco fusco. Saí do barco carregando duas malas, uma grande e outra menor. Ambas cheias. Ambas pesadas.  E isto porque a terceira já a havia deixado ficar guardada no hotel do Rio.

Uma vergonha, senti! Um excesso do qual me arrependi e que seria uma lição aprendida (bem me avisaste Filipe!). E tudo porque …

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Boipeba é uma ilha a sul de Salvador.

Esta ilha pertence ao arquipélago de Tinharé, no município de Cairu, junto com a famosa Morro de São Paulo, no estado da Bahia. E, em Boipeba, não circulam carros.

Tudo se carrega à força de braços!

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Mesmo que para chegar do cais à pousada, onde fiquei, se subisse a pique, quase até ao céu, em terra firme e areia deslizante, cerca de um quilometro.

Mil metros que o caríssimo Romário, braços fortes, pernas rijas, percorreu empurrando uma carreta de mão com a bagagem que a madame decidiu trazer para uma ilha em que o desapego é a marca enraizada das gentes.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

O Romário, tinha vinte e um anos. Ele não tinha estudos. Nunca tinha saído de Boipeba, além de uma dúzia de vezes a Valença, para comprar mantimentos. Não gostava, e por isso deixou de ir.

Era feliz. E isso diminuiu a minha culpa.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Do alto via lá em baixo a natureza beleza pura, beleza rara. É, eu tinha chegado ao paraíso, disso não tinha dúvidas!

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Após a caminhada nada longa, mas estafante e empoeirada, debaixo de um sol que se punha, sem no entanto permitir que o calor desse tréguas, chegava ao céu.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

No topo da ilha, com a noite estrelada a chegar, e uma vista de perder o fôlego,  percebia e materializava a velha máxima “menos é mais”.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Cheguei na pousada O Céu de Boipeba que ficava bem lá no alto da ilha. E sendo o ponto mais alto da ilha era bem perto do céu.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Estava estourada!

Estourada da subida agreste. Estourada do calor intenso. Estourada do pó colado à pele. Estourada da viagem longa e do cansaço das horas acordada que se fazia sentir.

Estava estourada! Mas o nome dizia-me que receberia em breve uma recompensa.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Entrei e, logo no começo das escadas de madeira, vários chinelos repousavam. Sinal de respeito ao pedido de os deixar na soleira, para não trazerem a areia e o pó para dentro.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

A minha reação foi nervosa.

Ao subir os degraus e “entrar” na casa de vidro aberta sobre o nada, que ali era toda a natureza que descia até ao mar, o riso nervoso, deu origem a uma espontânea gargalhada solta.

Eu não conseguia acreditar no que via.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Recebeu-me o Jesus, espanhol de Granada, que se havia apaixonado pela ilha e que ali ficara a gerir a pousada. Também estava o seu companheiro Vinicius, um baiano muito gente boa. E água fresca, que tanto agradeci e que me devolveu alguma clareza de ideias.

Que lugar estonteante, incrível!

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Depois da espectacular entrada, o Jesus levou-me ao meu quarto. Segui por um corredor de areia, onde se viam entradas de quatro quartos. O meu era o penúltimo. O calçado ficou à porta mais uma vez e abriu-se a porta.

A contra luz do entardecer não me deixava ver a dimensão de toda aquela magia!

O quarto era lindo, em madeira pau brasil e portadas de vidro gigantes, que não se fecharam nunca e deixavam entrar toda a luz e toda a beleza.

A cama gigante era protegida por uma rede mosquiteira que não permitiu que nenhum ser voador incomodasse o meu sono. E a vista era serena, os sons eram pacificadores, os cheiros eram estimulantes. Este quarto era apaixonante!

A elegância dos materiais usados, da decoração eclética, da abertura despudorada da intimidade ao exterior criava uma comunhão por mim jamais vivida.

A realidade desta fantasia era dourada e barroca e isso agradava-me porque de seguida sabia que a simplicidade do verde e do azul espraiava-se  no meu horizonte. E assim tudo era o que eu esperava que o céu fosse!

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

No alpendre, uma banheira de madeira nobre seria concha de banhos frios que acalmavam o calor que se fazia sentir.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Por companhia tinha, parede acima ou em saltos imprevistos, as rãs selvagens, conhecidas por pererecas, que a mim me prenunciavam a sorte e eu sentia-me bafejada dos pés à ponta dos cabelos.

A rede de algodão colorido disposta no angulo perfeito serviu-me de descanso e de reflexão.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

Tanto se estava a passar que eu necessitava de uma pausa, necessitava perceber porque tudo era tão perfeito, e realizava em consciência o meu percurso, a minha vida.

E apenas me ocorria agradecer o meu pedaço de céu, o meu paraíso, a minha vida.

BOIPEBA, UM PARAÍSO PERDIDO NO TEMPO

E adormecia por breves instantes para desfrutar do meu sonho.

mh

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