Era o meu último almoço no Rio de Janeiro. Desci Santa Teresa até à Lapa. Sentia um misto de alegria e tristeza que se prendia com o facto de ali estar de facto e dali partir dentro de horas.
Queria um boteco, queria carne seca, queria farofa. Queria ouvir: “Quirida, vai mais um chope gelado?”. Queria sim. Queria ficar.
Cheguei de novo à Riachuelo, uma das artérias principais da Boémia, na esquina com a Gomes de Freire, e dei com o Bar do Gomes, que na verdade chama-se Armazém do Thiago, mas que é assim que é conhecido.
Um boteco carioca típico onde também funciona o Espaço Ismael Silva, uma homenagem ao grande fundador da GRES Estácio de Sá e primeiro compositor a definir o samba numa estrutura rítmica seguida pelos demais sambistas dali por diante.
Ismael, já maduro, deixou o Estácio e passou a morar num prédio da Gomes Freire. Costumava, assim, frequentar o bar, vizinho ao prédio onde morava. Os proprietários do botequim, nos fundos da casa, colocaram 20 fotos. Essas imagens do sambista chamam a atenção dos frequentadores.
Célio Lins, um dos garçons, diz que, em geral, os frequentadores tiram fotos tendo as imagens de Ismael como cenário. “É muito gratificante ter Ismael como nosso patrono”, diz ele.
O almoço foi tranquilo e decidi dar uma volta aos Arcos. Fui saber da sua história. Acho que qualquer motivo serviria para ficar mais um pouco, só mais um pouco.
Então soube que os arcos da Lapa são um aqueduto construído no estilo romano, com imponência robusta, que tinha a simples missão de fornecer água a bairros que não a recebiam antes.
Ponto de residências de varias personalidades da história brasileira como Machado de Assis, Carmem Miranda , Manuel Bandeira, Jorge Amado, Vila Lobos, Silvio Santos ou Roberto Carlos.
Também são eternos na cultura local nomes como Madame Satã , Maria Preta, Tom Catatau, Ceguinho Bejamim, Selanon, e muitas outras personagens típicas que fizeram parte deste local singular no Rio de Janeiro. Conhecido por sua grande quantidade de botequins, boates, cabarés e muita malandragem , o bairro foi temido por muitos pela sua fama negativa e pelo abandono do poder público.
Há uns anos, antigos e novos empresários, começaram a fazer a sua parte num projecto de revitalização que tornaram a Lapa um lugar único e amado por todos cariocas, turistas, gringos, boêmios, fanfarrões, loucos, roqueiros, punks, pagodeiros, sambistas, forrozeiros, funqueiros e muitas outras tribos.
Então é isso, a Lapa é o lugar mais democrático do planeta onde todos tipos de cultura, educação , estilos se encontram no mesmo espaço e convivem muito bem. Não existe discriminação. Aqui você é só mais um na multidão, rico ou pobre, índio ou negro, alto ou gordo, punk ou funk.
E lembrei de Sérgio Costa, morador, frequentador, empresário, boêmio, carioca e amante da Lapa, que dizia:
Tenho um filosofia para isso: Acredito que todos que frequentam gostam e desejam voltar.
Tornar-se um CARIOCA.
Porque Carioca não é aquele que nasce no rio , carioca é um estado de espírito, ser carioca e ser feliz, ser simpático, ter swing. E ter amor e respeito a todos, ser receptivo , um bom anfitrião, uma ótima companhia para passeios ou um psicólogo de bar. Agora você já sabe!
Para ser carioca não precisa constar o RIO DE JANEIRO no seu bilhete de identidade, basta adquirir alguns hábitos.
Daqui segui feliz porque Carioca eu sou, onde quer que esteja, embora no Rio de Janeiro seja muito melhor!
mh
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