O dia havia sido pleno de sol, areia, mar e muita paz e sossego. Acabava com o astro rei a ser recebido pelo mar para dar lugar à noite. E, no breu, desci pelo caminho íngreme de terra com apoio da luz de mão, que nem a lua me iluminou lá do alto, para vir jantar à vila. Ia comer na Bahia Acarajé com Pimenta. E mais tarde outros segredos!
As opções eram muitas e variadas, geralmente aventuras de estrangeiros que se apaixonaram pela ilha e pela forma desapegada de se viver, e entre pizzarias italianas, creperies francesas, bistrôts argentinos eu optei pela barraca da Antonieta.
Ia finalmente comer na Bahia um acarajé com pimenta!
Acarajé é um bolinho de feijão frade moído que é frito em óleo de dendê. Depois de aberto ao meio é untado com pimenta picante, vatapá, camarão, caruru, molho vinagrete de tomate, cebola e pimento. Finalmente servido e uma delícia! Adorei mesmo!
Mas a vida tem me provado que os momentos é que transformam um acarajé numa delícia inesquecível e o sorriso puro da baiana Antonieta, que me recebeu de braços abertos, completou a memória.
Na pureza da genuinidade fui-me encontrando. É que eu sou assim e não me quero esquecer do bem que soube!
Mas há mais segredos! Muitos mais!
Eu sou de comer, não sou esquisita, provo de tudo, raramente não gosto, e quase sempre o momento faz toda a diferença para que considere ser uma grande almoçarada ou jantarada. Depois há segredos que se revelam e nada os supera.
Quando, de manhã, saía para a praia, não tinha em mente uma, mas todas as praias que ali me rodeavam. De Moreré ia até à Cueira e de lá até Tassimirim. E foi num destes dias de caminhada, sem propósito, que lá cheguei. Protegido pelo verde do mato, numa barraca de madeira, modesta, estavam mãe, filho e a burra estrelinha.
Em toda a ilha, Luciano era conhecido por sua moqueca de camarão. Mas o que me viria a fascinar era a sua forma de ser e isso era o verdadeiro tempero da sua comida. A sua mãe prepara os alimentos que são na hora cozinhados pelo filho. Na hora, eu quero dizer quando se chega, se escolhe e se pede. Só aí se inicia todo o processo lento, delicado e de amor que o Luciano tem com os tachos.
Ele é magro, muito magro, de sorriso fácil, olhos tristes caídos, cabelos negros e longos. Ama o que faz. Sente-se. Atende quatro a cinco mesas. Não quer mais. No verão, pede ajuda ao irmão para o serviço que triplica. não gosta. não quer confusão.
Espanta-se quando lhe dizem que a sua moqueca é famosa lá no Rio de Janeiro ou em São Paulo. Diz-me
Não queria não! Quero paz e sossego!
Acredito que sim. As gentes de Boipeba não têm pressa, assim querem estar. Ser.
Deixo-lhe a cozinha onde se esconde no escuro a magicar. Bebo uma água de coco, dou um mergulho, ou dois, ou três … porque o tempo passa devagar e ninguém olha para o relógio. Quando chega à mesa percebo tudo. Olho o horizonte e desfruto o que a vida me dá.
No fim, depois de me lambuzar com um doce de ameixa feito pela mãe, despeço-me, antes da maré subir e esconder Tassimirim do mundo, desejando
Sucesso Luciano!
Sossego, Helena, sossego!
mh